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“Pagar para ver”
Vítor Gouveia, outro dos ex-jocistas que integrou o grupo fundador, junta-se à conversa e lembra os sobressaltos que o projeto sofreu. Tantos e tão tortuosos que até a sua mulher desistiu: “Uma vez, numa reunião na BASE-FUT [Base-Frente Unitária de Trabalhadores], decidimos acabar com a ideia. Mas depois, duas pessoas fizeram intervenções que nos levaram a reconsiderar e dissemos: ‘Bem, vamos pagar para ver.’” Pagaram e hoje podem ver. Alinhavaram um primeiro anteprojeto. Andaram a correr as capelinhas (neste caso as câmaras municipais da área de Lisboa), até que encontraram um interlocutor válido no então presidente da Câmara de Loures, Demétrio Alves. Daí veio o terreno. Mas depois o presidente foi-se, a Câmara mudou de cor política e o terreno esteve quase para ir também. Acabou por ficar, mas com menos metros e lá se foi o projeto das hortas comunitárias e do centro para jovens toxicodependentes. Ficou o lar, o centro de dia e a animação da comunidade sempre a crescer graças a projetos concretizados com apoio de prémios e concursos ganhos.
O conceito inicial de “uma iniciativa ativamente participada pelos interessados” levou-os a optarem por serem uma cooperativa. A ideia de que não seria apenas para eles traduz-se hoje no facto de entre os 58 residentes só cinco serem cooperantes do início. O espírito solidário que sempre os animou mantém 11 lugares reservados (e ocupados) para pessoas ali colocadas pela Segurança Social, embora esta não pague senão 32 por cento do custo real da estadia, deixando um défice anual superior a 50 mil euros. Mas é por isso mesmo que fundaram uma cooperativa social e não uma sociedade com fins lucrativos.
Na altura, pareceu-lhes uma eternidade os anos que decorreram entre o grupo inicial e a abertura do polo de São João da Talha. Mas em dez anos conseguiram fundar a cooperativa, obter o seu reconhecimento como IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social), recolher os 15 mil euros de participação de cada um dos 50 cooperantes, receber o terreno, contratar sucessivos arquitetos para o desenho do edifício, negociar com o Ministério da Segurança Social e com os bancos os fundos complementares, lançar e terminar a obra e abrir o polo.
Uma década de trabalhos em que, segundo o cooperante Amadeu Teixeira, “este projeto se afirmou como sendo diferente de outros” porque nele “são os promotores quem foi buscar o financiamento e os apoios” e nunca quiseram “nada de graça; o que se obteve foi sempre por contrapartida de serviços a prestar”. Irónico, lembra as regras e regrinhas impostas pelos serviços da Segurança Social quanto aos requisitos a que o edifício devia responder, mas o “segundo elevador foi a cooperativa que teve de o instalar às suas custas, pois para a Segurança Social um elevador bastava numa casa com mais de 50 pessoas.”